terça-feira, 17 de maio de 2011

Atividade de Segurança Privada

Deve ser compreendida como uma extensão, uma parceira da segurança pública e não uma concorrente. Esta é dever do Estado e aquela uma faculdade do particular de proteger a si, sua família, seus empregados, seus bens e seus interesses, nos limites permitidos pela lei.
O exercício desta faculdade, ou melhor, desse direito de agir é personalíssimo. Essa condição faz da segurança privada uma atividade não terceirizável, diferente da vigilância que é um serviço delegável a terceiros, como tantos serviços que a segurança utiliza para proteger um bem, diante do grau de risco a que está sujeito.

A atividade de segurança privada foi regulamentada em nosso país em 1983, pela lei 7.102, que disciplinou a segurança dos estabelecimentos financeiros. Esse diploma legal pôs em evidência os fundamentos da segurança patrimonial, ao exigir que cada agência bancária tivesse seu próprio planejamento de segurança e empregasse dispositivos de proteção física. Foi essa lei que oficializou a profissão de Vigilante e regulamentou as atividades das prestadoras desse serviço. Ao dispor que “o sistema de segurança será definido em um plano de segurança compreendendo vigilância ostensiva com número adequado de vigilantes, sistema de alarme e pelo menos mais um dos seguintes dispositivos:…..”, referida lei limitou o papel da vigilância e o grau de responsabilidade que recai sobre ela no contexto da segurança privada. O texto não poderia ser mais claro: vigilância é um dos serviços que integram a segurança e sua missão está contida no plano de segurança.
O estabelecimento da política, das normas e das rotinas de segurança, seja na residência, loja ou fábrica, compete ao respectivo gestor, que detém o poder disciplinar. E, em se tratando de um estabelecimento, é sob sua responsabilidade que se implantam os dispositivos de controle de entrada e saída de pessoas, volumes e veículos à área interna; a obrigatoriedade ou não de revista e necessidade de identificação funcional; a fixação das áreas de circulação restrita e de tantas outras atividades que afetam a segurança. Cabe-lhe, ainda, o exame da conveniência e oportunidade de implantar recursos de segurança física, como barreiras externas e internas (cercas, grades, portas etc.); iluminação de segurança; sistemas de alarmes e outros, assim como eventuais medidas de prevenção contra intrusão eletrônica, de proteção à privacidade, dos segredos industriais etc. Por fim, somente o responsável pelo bem pode aferir o nível de segurança desejável e essa definição leva em conta a avaliação do custo/benefício, dos riscos e dos recursos financeiros disponíveis para custear sua implantação e manutenção. E quando se trata de riscos há apenas três opções: ou se assume, ou se transfere ou o neutraliza.
A atividade de segurança privada dispõe de um conjunto de técnicas, a começar pelo estabelecimento de uma política que valoriza a vida acima de tudo e preconiza a execução de dos demais serviços de maneira segura e responsável, respeitando e preservando a integridade física das pessoas, o meio ambiente, a continuidade operacional e o patrimônio, com um mínimo de desgaste para a empresa. Para execução de alguns serviços específicos, utiliza serviços prestados por terceiros, tais como vigilância armada ou desarmada, televigilância, transporte de valores, segurança pessoal e outros, desde que legalmente autorizados pela autoridade competente. Assim, a responsabilidade pela atividade de segurança privada e conseqüente elaboração e operação do respectivo plano de segurança recai sobre quem detém poder para estabelecer a política, as normas e as rotinas de segurança. Diante de tanta complexidade, surgiram profissões (ainda não regulamentadas) especializadas no assessoramento do gestor do bem a ser protegido.
O respaldo para atuação da segurança privada está calcado na legitimidade de toda pessoa, física ou jurídica, de proteger a si e a seus bens. E no poder que a administração (privada, doméstica ou empresarial) tem de disciplinar e ordenar o caminho para alcançar seus objetivos. Este poder, limitado pela lei e circunscrito à área de domínio da pessoa (física ou jurídica), é similar ao poder de polícia do Estado. No tocante à legalidade, o Código Civil (Art. 1210) concede à pessoa que detém a posse ou propriedade de um bem, o direito de defendê-lo, utilizando a própria força no limite do indispensável. A lei 7.102 esclarece que “vigilância ostensiva consiste em atividade exercida no interior do estabelecimento e em transporte de valores, por pessoas uniformizadas e adequadamente preparadas para impedir ou inibir ação criminosa”. Assim, as ações necessárias ao exercício regular desse direito podem ser delegadas a terceiros. Por exemplo: um vigilante legalmente investido no cargo e a serviço do contratante, agindo com moderação na defesa de injusta agressão a um bem (pessoa ou coisa), está cumprindo um dever legal. Ainda que tipificada como crime, tais condições retiram o caráter criminoso da ação. E, como regra geral, a própria Constituição impõe a responsabilidade individual pela segurança pública.
Todavia, há questões de fundo, ainda pendentes, como os limites entre segurança privada e a pública, ou até onde pode/deve ir o controle do Estado sobre o sistema de proteção privado. Qual a melhor alternativa para regular essa atividade? Seria o caso de substituir as normas disciplinadoras públicas por requisitos contratuais de seguradoras na proteção de estabelecimentos, especialmente os financeiros e o transporte de valores? A privatização da fiscalização da qualidade dos serviços e de sua eficácia seria mais eficiente do que a atual? A convergência de objetivos e interesses públicos e privados e as regras de mercado são mais eficazes que as normas legais? Os sistemas de proteção eletrônica, de transporte de valores e cargas, de investigação e rastreamento de seguros e tantos outros podem/devem interagir com os sistemas públicos? E como ficam as ações típicas de polícia cometidas à segurança privada por força de convenções internacionais, como o ISPS Code em relação aos portos? Ou, ainda, nas grandes áreas condominiais (residenciais, shoppings etc.) e na privatização de vias de transporte, como fica a segurança coletiva? Até onde pode/deve ir a troca de conhecimentos entre as áreas de inteligência pública e privada? A atual legislação está longe de oferecer respostas. Estas e outras questões requerem cuidados, para evitar que o Estado e o particular, ao darem as mãos, não ultrapassem as fronteiras, transformando em favorecimento comercial ou indébita utilização do aparato privado pelo público.
Como se vê, ainda há muito caminho a percorrer. Daí a importância de continuarmos debatendo o tema!
Fonte: www.forumseguranca.org.br